Orgulho praxístico

Viver e estudar no Porto foi das experiências mais ricas que tive, a experiência de praxe em Jornalismo e a compreensão da mensagem de orgulho no curso e na Universidade é algo de inigualável. Não vou esquecer nunca o meu primeiro dia de praxe, andar pelas ruas da cidade, a envergar aquela camisola azulona, a berrar por Letras e a cantar ao desafio com todos os outros cursos que passassem por nós. Não vou esquecer a minha primeira Queima, o meu primeiro Cortejo, a minha Serenata. A tradição da UP é forte, bonita, e marcante. Mas isso foi há dois anos atrás e só ontem é que acabou uma das quinzenas mais bonitas do meu percurso académico.

Na Madeira, tradição académica é coisa que não há realmente. Fui praxado, o ano passado, pelo orgulho de ser praxado em Medicina. Mas não posso dizer que tenha sido grande experiência. A verdade é que quem estava na nossa frente, de capa traçada, pouco sabia de tradição, amor, do sofrer, do orgulho. Tivemos a sorte de ser um grupo de caloiros que já tinha estado em outros cursos pelo Porto e Coimbra e não perdemos o espirito. Este ano, de capa e batina, fizemos um trabalho fabuloso.


Os nossos caloiros, fresquinhos e novos,vindos dos anos de 1990 e até 1991 (!) nada sabiam de praxe. Nada sabiam de tradição e significado. Tinham aquela ideia que iam para ali fazer umas palhaçadas e pouco mais. No inicio, parecia que era só o que iam ter, mas com pouco tempo começaram a perceber que Praxe é muito mais que isso. Mais do que integrar, criar espirito de grupo, camaradagem e entreajuda, a Praxe no curso que desejamos do coração tem uma componente emocional enorme. É preciso abrir o nosso espirito e assumir "quero ser caloiro aqui, quero percorrer o caminho, conhecer cada pedra, cada curva, para que a meta seja o que menos importa!"


Conseguimos fazê-los sentir isso. Muitas foram as vezes que estiveram de quatro sem perceber porque, muitos foram os berros supostamente sem sentido que levaram na cabeça. Mas tudo isto sempre acompanhado de um discurso e acção cheiao de sentimento e de orgulho e de noções de conquista que eles não tinham antes.

Ainda ontem li, no Público, uma série de comentários com a lengalenga do costume a dizer que a Praxe é só uma maneira dos "estudantes faltarem às aulas pagas pelos contribuintes" ou então uma forma de "fascismo e descarga emocional para gente frustrada". Não digo que não aconteça. Mas a maior parte das boas praxes nos mais variados cursos faz é envolver os caloiros num ideal, dar-lhes uma crença, a de que o seu curso, o pequeno universo de que eles fazem agora parte, é o melhor curso e o melhor lugar do mundo. E para entrar lá não basta ter grandes notas. É preciso conhecer o ritual. É preciso sentir que não há melhor sítio onde estar. É preciso querer o amarelo como se não houvesse outra coisa na vida.


Uma das ultimas Praxes que fizemos foi da meia noite às 3 da manhã. Foi lindo, só me faltou mesmo a lagriminha no olho, ver aqueles 35 amarelinhos a minar completamente a entrada da Universidade com cartazes de Medicina por todo o lado. E com uma belíssima faixa de 5 metros a voar bem alto, para que todos a vissem. O efeito na manhã seguinte foi assombroso e vai-se falar disto durante muitos anos. Porque nunca ninguém fez nada assim, e duvido que se faça tão cedo! Orgulho-me de poder dizer "fui eu que organizei isto". E tenho pena de ir embora da ilha no fim deste ano, porque este curso, com estes doutores e estes caloiros, podia fazer história na Universidade da Madeira e aproximá-la um pouco do espírito académico do Porto e de Coimbra, se nos "deixassem" ficar por cá mais uns aninhos...

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