...There's somethin bout these blues

that makes all ma blues go away.


Este senhor tem 83 anos! Oitenta e três! Certamente não será o modelo de saudável postura cardiovascular, ok, e a única pena que isso me dá é que lhe possa dar um fanicozinho antes de eu ter a chance de o ver ao vivo.

Apesar de me ter iniciado nos blues com o brilhante Eric Clapton e o ter idolatrado incondicionalmente, o tempo encarregou-se de me ir apresentando a B.B.King. O que fez com que não mais o largasse. Ele é a personificação das àguas do Mississipi e o mais eloquente dos "cantadores" dessas simples histórias "azuis". Do dia a dia no profundo sul americano, da batalha dos afro-americanos por uma vida digna. De amores sem correspondência, do desengano, da paixão. De respeito próprio.

A repetição de cada verso 3 ou 4 vezes, cada vez com nova eloquência, para que o marquemos bem, é algo que adoro porque me imagino qual grande negro cheio de soul a declamar música para o mundo! E aquela guitarra, com barras que eu nunca conseguirei fazer, apesar de soarem tão espontaneamente simples.

Gosto, e vou gostar sempre disto. Relaxa-me, relativiza o meu dia-a-dia, o meu pequeno verso de tristeza. Dá-lhe uma melodia electrizante e aconchegante. E prepara-me para outra.

De volta ao ínicio, e ao elogio ao King: aos 83 anos gravou um album fabuloso com algumas das mais marcantes músicas dos blues do século XX. "One Kind Favor" é, certamente, um album a comprar. E guardar, ad eternum, porque infelizmente parece-me que será díficil a renovação. O título do album baseia-se na sua canção de abertura "See that my grave is kept clean". E se não é uma despedida, parece.

B.B. King. é, de facto.

Momentum Perpetuum



Dia 1 de Janeiro 2010, 18h, Casa da Música.

Nunca, por iniciativa minha, iria sair do sofá no primeiro e mais ressacante dia do ano. Mas família é família e a minha pequena prima Mafalda parece gente agora, com 17 anos, e toca violino naquela que é a "não-oficial" Orquestra Jovem Nacional. Chama-se Momentum Perpetuum e é organizada pelo maestro inglês Martin André e pelos próprios músicos que vêm dos diferentes conservatórios do país. Tudo sem um centavo do Estado Português, claro está. Razão porque somos o único país da Europa cuja Orquestra Jovem não é oficial.

Não sei nada de música clássica. Sou um leigo do mais baixo estatuto. E com que pena minha! Ao primeiro minuto, só conseguia pensar "como é que é possível ter chegado aos meus 22 anos sem nunca ter assistido a uma orquestra ao vivo?!".

A estreia mundial da composição "Yellow Story", de André Miranda, 20 anos, compositor residente da Casa da Música para 2010, deixou-me com os olhinhos a brilhar. Percebi ali que tinha que instituir um ritual. Começar cada ano com aquela paz envolvente que só a música dos grandes mestres pode trazer. Com vivaces, allegros, vibratos e tudo isso o que ainda não sei bem definir mas que consigo entender.

Depois veio Anton Dvorák e a minha viagem continuou, serena, doce, onírica. E depois energética, vívida, poderosa. E então desafiante, nocturna, fantástica.
Senti-me revigorado, novo, renascido, expurgado de todo o mal de um ano que acabava de passar. Eu sei que é só um marco no tempo, um dia no calendário. Mas faz parte da memória. É sempre "o ano em que" morre alguém, conhecemos alguém, vamos a algum sítio. A história que a música conta é sempre a nossa história, num qualquer momento. No passado e no futuro. Dá-nos o "closure" necessário sobre o que passou e, ao mesmo tempo, a vontade épica de fazer deste que aí vem o ano das nossas vidas.

Feliz 2010 a todos!