Ontem passei 4 horas no Coliseu dos Recreios. Fui assistir à minha primeira "Noite da Medicina". Sobre o que me esperava, não fazia ideia realmente, visto que toda a vida académica lisboeta me passou completamente ao lado nestes dois anos na Madeira. Estava portanto na hora de assentar, começar a entrar de novo nas actividades que marcam a nossa passagem pelo curso, vestir o meu traje e sair pra rua com orgulho.... Mas sinto cada vez mais que não o vou conseguir fazer. Nunca, nos meus dois anos de Porto ou nos dois de Funchal me deparei com aquilo que vou encontrando aqui. Lisboa não é sobre o curso em que andas, não é sobre as cores que defendes, não é pelos valores com que te impões.
Lisboa é show off. É a cidade mais exibicionista e egocêntrica que conheci. Ontem, no Coliseu, fui plateia (lol, fui balcão na verdade) do espectáculo que celebrava esse grande feito - ser médico. Cada ano do curso apresentava um sketch de video e um número de palco, numa sala em que só entrava quem fosse pré-sr.dr ou sr. dr. - Aliás, cheguei mesmo a ouvir um "heya, como é que entraste aqui?" por uma rapariga que me apresentaram mas que pensou que eu era de fora. Mas o pior de tudo foi o "Prémio Aluno", dado ao caloiro que entrou com a nota mais alta na FML este ano. Espero que aquele cheque de 1000(!!!!) euros não tenha saído da minha anuidade na Associação, porque de facto celebrar o marranço e os externatos privados não é para mim.
Enfim, depois disto, a festa. No BBC, Belém Bar Café, fechado, claro está, àqueles que tinham ido ao coliseu...
Faz-me uma confusão tremenda. Nas últimas 3 festas a que fui, eram só de Medicina. Misturar-te? Tá muito de noite. Não vai dar, fica prá próxima. E é por estas e por outras que Lisboa nunca terá nada em espírito que se pareça com o Porto ou Coimbra. Porque cada Faculdade se fecha no seu próprio mundinho, de onde tem a ilusão que nascerá o próximo grande político, gestor, magistrado, ou cirurgião de todo o país. Virá, concerteza, "da casa", e será celebrado como tal, com todo o esplendor que deve à sua imaculada carreira. E um dia, será professor nessa Universidade que o formou. E, tal como hoje, vai ter 300 alunos a ouvi-lo mas não é por isso que ele está lá. É pelo gosto de se ouvir a si mesmo. E de ser, com certeza, uma autoridade nacional no assunto.
E assim fica pelo caminho a vontade de trajar, porque não significa nada que não vaidade. Fica-se pelo caminho a vontade de ser monitor, porque o que conta não é dar a aula mas brilhar perante o regente da cadeira. Fica-se pelo caminho a paixão, atropelada pela debandada de quadrúpedes em direcção ao carreirismo galopante.
Certamente que estou a exagerar, aqui e ali. Nem todos são assim, nem todos respondem a este ciclo automático de comportamento. E, claro, há muitas coisas boas a extrair desta cidade e da FML. Mas parece-me que começar por pintar o quadro mais negro é melhor, para que vá vendo as coisas com mais entusiasmo à medida que for encontrando as cores.